domingo, 31 de janeiro de 2016

O ano em que ela tornou-se completamente vazia

'Esse vai ser o ano.', pensou. Nada poderia dar errado. Ela estava mudando, estava recomeçando, cidade nova, casa nova, emprego novo, vizinhos e amigos novos. Finalmente havia deixado tudo para trás, não se martirizava mais, tampouco lamentava. Após muito tempo, lá estava ela se reconstruindo, remontando seus pedaços. Seria até poético, se não fosse triste.
Triste porque ela se machucou. Triste porque ela teve que deixar pessoas que ama para trás. Triste porque a ferida pode estancar, mas a cicatriz vai sempre estar lá. Triste porque algo assim é impossível de esquecer.
Mas tudo bem. Ela estava bem. Já fazia um tempo que não chorava, já havia até mesmo retornado a sua vida social. Agora tinha amigos novos, amigos os quais só apareciam de quinta à sábado, para a balada, claro.
Ela também já tinha conhecido um carinha com quem estava saindo. Nada sério, sabe? Apenas alguns amassos no carro, uns encontros casuais em barzinhos da cidade e algumas idas no cinema. Se encontravam quando batia a carência. Ela ligava, ele ia. Não havia compromisso algum, apenas sexo.
Sua atual vida parecia vazia. Nada de amigos de verdade. Tampouco um ficante que algum dia tivesse a chance de vir virar um namorado. Tudo girava em torno de trabalho durante a semana e farra aos fins de semana.
Apesar de todo o vazio, ela estava bem. Se contentava com poucos momentos felizes e boas lembranças para guardar. Enquanto as segundas, terças e quartas eram dias de completa tortura no trabalho, as quintas, sextas e sábados eram dias de completa folia, pareciam até mesmo carnavais fora de época. Já para o domingo sobrava apenas a solidão.
Os domingos ela guardava para ler um livro, fumar um Marlboro e beber um vinho qualquer. Era o único dia que tinha realmente para si. Ela costumava chamá-lo de 'O Grande Dia'. O grande dia em que nada acontecia. O grande dia em que ela passava de pijama jogada no sofá da sala variando a atenção do romance que nunca vai terminar de ler para reprise de Friends na televisão.
Ás vezes, quando a solidão era demais, ligava para o tal carinha com quem saia. Na maioria das vezes ele inventava desculpas, mas ás vezes aparecia e a fazia companhia. Mas quando aparecia era apenas em busca de sexo, sem se importar em dar a ela algo a mais, em dar a ela sua amizade.
Apesar de toda a solidão. Ela estava bem. Não sentia mais a necessidade de chorar por um amor do passado, nem sofria mais ao lembrar daqueles que a magoaram. Ela passou por muito coisa, foi intensa demais, amou demais, se entregou demais. Agora tudo que ela quer é segurança. É a segurança de saber que não vai ter mais ninguém capaz de partir seu coração. A segurança de saber que ninguém vai se aproximar o bastante a ponto de feri-la quando for a hora de ir embora.
Ela estava certa. Esse ano vai ser 'o ano'. O ano em que ela deixou pra trás tudo o que a magoava. O ano em que ela tornou-se alguém que abominava. O ano em que ela descobriu que sentir demais é sinônimo para sofrer demais. O ano em que ela tornou-se completamente vazia.

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