quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Allie e Elliot: O começo

Apesar de estar com um péssimo humor, tentei ser simpática e dei um dos meus melhores sorrisos. O cara que havia me ajudado, retribuiu meu sorriso. Quando ele sorriu, não pude deixar de notar o quão perfeitos e brancos eram seus dentes. Provavelmente ele usou aparelho durante toda a adolescência ou sua boca era a 8ª maravilha do mundo.
— A moça se machucou?
Apenas neguei com a cabeça. Pela primeira vez na vida, olhando para aquele completo desconhecido, me aconteceu algo inédito: esqueci de tudo. Por alguns segundos foi como se eu não tivesse que ir trabalhar, como se as outras pessoas em volta não existe, como se a única coisa que importasse estivesse ali, bem na minha frente. Me achei uma completa idiota por me sentir assim. Até mesmo porque eu não o conhecia e provavelmente sua primeira impressão sobre mim deve ter sido “Essa garota é uma louca, olha como ela está me secando!”. E realmente, meses depois fui descobrir que não estava tão errada quanto á isso, a primeira impressão dele sobre mim foi algo parecido.
— É, acho que preciso ir para o trabalho.
— Tem certeza que não se machucou? Se quiser posso a levar ao hospital…
— Não, sim… Quer dizer, não me machuquei, tenho certeza. Foi só um tombo de nada.
Dei um sorriso torto e acenei para ele. Então fui tentar andar e senti uma dor insuportável na perna esquerda, que faz com que eu soltasse um gemido. Olhei para o tal estranho e ele me fitava com diversão nos olhos. Ah, que olhos! Um par de olhos castanhos grandes, um olhar com um brilho diferente, juro que se não fosse tão constrangedor eu teria ficado encarando aqueles olhos por horas e horas sem me cansar.
— Acho que você não tem tanta certeza assim, não é? Vem cá, vou te levar ao hospital.
Sem nem ao menos esperar que eu respondesse, ele estendeu o braço direito na minha direção e laçou minha cintura fazendo com que as laterais de nossos corpos se encostassem. Mesmo com algumas camadas de roupas entre a gente, me arrepiei ao senti-lo tão próximo de mim. Envolvi meu braço esquerdo em seu pescoço e apoiei o peso do meu corpo sobre ele. Dali fomos nós dois em direção ao hospital da cidade. Durante os 10 minutos em que levamos para finalmente chegar ao hospital, nenhum de nós ousou falar qualquer coisa. Mas o silêncio que reinou entre a gente, foi diferente, não havia nada de constrangedor, pelo contrário, foi uma sensação boa ficar com ele em silêncio. Foi como se estivéssemos conversando de um jeito diferente. Vezes ou outra ele me olhava e eu sorria, então ele sorria de volta. Assim que chegamos ao hospital, meu estranho gato de olhos castanhos me ajudou a sentar em uma das cadeiras azuis de plásticos e foi até o balcão pegar uma ficha para que eu preenchesse.
— Quer que eu preencha?
— Não, tudo bem. Acho que consigo escrever.
Ambos demos uma risada baixa e ele piscou pra mim. Peguei o prontuário e a caneta de suas mãos e comecei a preencher minhas informações, não demorou muito e devolvi a ele para que entregasse a recepcionista.
— Allie Green? Americana?
— Minha família sim, eu não. Sou brasileira.
— Sou Elliot. E também sou brasileiro.
— Prazer, Elliot. E ah, mais uma vez obrigada.
Ficamos conversando até que uma enfermeira chamando pelo meu nome nos interrompeu. Elliot me contou que tinha 23 anos, que morou durante 10 anos na Europa e que havia cursado direito. Contei a ele sobre meu trabalho no jornal do estado e sobre minha paixão por livros. Não parecíamos ter muitas coisas em comum. Ele apesar de jovem, já havia viajado bastante. Enquanto eu, se muito sai de Minas umas 4 ou 5 vezes em toda a minha vida, quem diria do Brasil. O médico que me atendeu, concluiu que eu havia torcido o pé, portanto teria que ficar alguns dias de repouso sem andar. Sai do consultório mancando e com o pé imobilizado, e lá estava Elliot ainda sentado em uma das cadeiras me esperando.
— Você devia ter ido embora, não precisa me esperar.
— Mas eu quis esperar, caso você fosse precisar de mim.
Pedi um táxi e Elliot fez questão de me acompanhar até meu apartamento. Depois de se certificar que eu estava bem acomodada, ele se despediu, mas deixou seu número anotado na minha agenda telefônica e anotou meu número em seu celular. Nos despedimos, mais uma vez o agradeci por tudo e ele foi embora com a promessa de ligar mais tarde para saber como eu estava.
Algumas horas depois de Elliot ter ido embora, enquanto eu ainda estava deitada no sofá da sala relembrando sobre como meu dia havia começado, meu telefone tocou e era ele. Já era quase noite quando ele me ligou. Conversamos até tarde e dessa vez fui eu quem despedi com a promessa de ligar no outro dia. Aquela foi a primeira de muitas noites em que Elliot me fez ir dormir sorrindo, assim como aquele foi o primeiro de muitos dias em que Elliot fez com que tudo ficasse bem, por mais difícil que fosse.

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